De família italiana, cresceu rodeada de vários primos. Quando criança passou por um período em que ficava muito tempo doente, logo precisava fazer repouso; então nesse período aprendeu a fazer trabalhos manuais e passou a ler livros que suas amigas e familiares traziam para ela. Aos 18 anos, dedicou-se a cuidar de sua mãe, ao mesmo tempo em que vendia os frutos do que produzia do artesanato. Antes de ingressar no IMES, só o conhecia de nome; soube pelo padre da igreja que frequentava sobre uma vaga temporária na pós-graduação do IMES. Chegando ao fim do seu contrato de trabalho, foi convidada a trabalhar em outros setores do IMES e no fim de maio de 1987 tornou-se funcionária fixa, trabalhando então na biblioteca. Cinco anos depois ingressou no curso de Psicologia na Universidade Metodista. Na USCS, organizou encontros ecumênicos, voltados para o público interno da universidade. |
|
Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS)
Núcleo de Pesquisas Memórias do ABC e Laboratório Hipermídias
Depoimento de Claudia Conceição Bueno dos Santos, 59 anos.
São Caetano do Sul, 16 de novembro de 2016.
Pesquisador: Luciano Cruz
Equipe técnica: Ileane da Silva Ribeiro
Transcritora: Bruna Moura
Pergunta:
Claudia, queria que você começasse falando nome completo, local e data de nascimento, por favor.
Resposta:
Meu nome é Claudia Conceição Bueno dos Santos, eu nasci em Santo André, no dia 30 de maio de 1957.
Pergunta:
O Claudia tem acento, esse Claudia?
Resposta:
Não, não colocaram. Deveria ter, mas não. [risos]
Pergunta:
Só para a gente colocarem aqui direitinho lá no GC, no gerador de caracteres. Bom Claudia, podia começar falando a sua primeira infância, lembrando um pouquinho das memórias que você tem da sua família, da casa onde você morava, como que era esse núcleo familiar, fala um pouquinho o que vem à sua mente.
Resposta:
É, eu sou filha única, então eu não tinha irmãos, mas na realidade aquela família assim italianada, que um mora na rua da cima, o outro mora na casa do lado, então a gente tinha uma família grande. Eu tive muitos primos, a ligação com os vizinhos era muito grande, então eu não fui uma criança que cresci sozinha. Eu realmente cresci rodeada de vários primos, meus avós, meus tios, então eu fui uma criança com uma infância alegre, muito alegre. Mas eu tive um período de ficar muito tempo doente, então eu fiquei acamada por quase sete anos. Então eu tinha muitas dificuldades e era obrigada a fazer muito repouso, e isso acabou me levando a aprender muito trabalho manual porque, embora criança, sete anos, eu não podia ficar brincando, eu não podia com nada quem fossem as brincadeiras de criança, então eu aprendi com mãe, com vó, com tia, a bordar, fazer tricô, fazer crochê, eu ouvia muitas novelas, naquele tempo tinha teatro pelo rádio, novela, era muita programação, de documentário. O rádio era um ponto alto, então era muito interessante, a imaginação crescia muito, porque a gente tinha que imaginar tudo o que hoje a gente vê na TV, só por aquilo que a gente ouvia. E, mediante a isso, eu passei a ler muito. Então era muito comum eu ler em dois, três dias eu lia um livro. E de tudo, mesmo criança, o que caísse nas minhas mãos. Todo mundo sabia que eu gostava de ler, então meu tio tinha muito gibis e me trazia os gibis, as minhas amigas traziam os livros da mãe, a mãe estudava enfermagem e me trazia livros, e eu acabei lendo de tudo. E esse tipo de confinamento de coisa me fez crescer muita coisa, apesar de tudo, me fez ir muito para o lado cultural, que não era muito comum da criançada toda, ainda mais a criançada de bairro, que naquele tempo tinha muito quintal, muito bicho, cavalo, podia realmente se esbaldar. Mas foi um ponto positivo. Depois de tudo isso, eu tinha muitos planos, eu sempre fui uma excelente aluna de matemática. Então, o meu sonho, era fazer astrofísica [risos]. Eu participei de Olimpíadas de Matemática, essa coisa toda, eles tinham até me conseguido uma possibilidade de estudar na Alemanha. Meu pai, na época, trabalhava na GM e ele poderia pedir transferência para a Alemanha, mas eu tinha uma mãe com sérios problemas psíquicos e ela não aceitava mudança em hipótese alguma. Então eu aposentei essa ideia, no Brasil não era muito veiculada a coisa, era mais difícil, então eu fui aposentando a ideia, e eu acabei nem indo para a faculdade na época, porque realmente a minha mãe ficou muito doente. Então ela requeria uma atenção absoluta sempre. Então o que eu fazia: eu me dediquei mais ao artesanato de uma forma geral. Então eu já fazia de tudo, eu já fazia roupas, fazia tapeçaria, pinturas, e eu vendia isso, mas era uma coisa que dava para eu fazer em casa, cuidando dela. Então foram muitos anos dessa forma, até que a situação física dela foi ficando muito desgastada, e ela acabou tendo uma internação no interior de São Paulo, e eu fiquei livre.
Pergunta:
Quantos anos você tinha?
Resposta:
Eu tinha 27 anos. Ela foi internada no interior de São Paulo, e aí me convidaram para fazer dois meses aqui na USCS no pós-graduação, uma pessoa ia sair de férias e tal, e se eu cobriria aquele espaço. [5’] Aí: ‘eu vou, né? É mais animado, aquela coisa toda’. Eu vou fazer, agora eu não tenho responsabilidade dela, ela está sendo bem cuidada, e eu vim para cá. Fiquei no pós-graduação esse tempo, na época o diretor era o professor Silvio, a gente ainda não tinha reitoria, era uma faculdade pequena, e lá no pós-graduação também, a gente era…a coordenação era do professor Djalma, e eu fiz esses dois meses. Voltei para a minha casa, logo em seguida minha mãe voltou para casa também, aí me chamaram. Alguém ia pegar uma licença maternidade, no caso era a secretária do professor Silvio, da diretoria, e eles precisavam substituir uma pessoa que sairia da recepção passaria a ficar lá na reitoria, precisaria ficar ali na recepção, e eu vim para fazer aqueles cinco meses que era o afastamento da secretária.
Pergunta:
Claudia, eu vou voltar aqui na USCS, mas você me falou algumas coisas que me chamaram a atenção, desse seu primeiro período, eu ia falar também do microfone, eu acho que está batendo, né? [pausa para arrumar o microfone] Você falou das novelas, e dos livros, e que estão muito na base da sua formação também, né? Você lembra de algumas dessas novelas ou algum desses livros que foram essenciais para você nesse momento?
Resposta:
Olha, novelas eu não vou te dizer que eu me lembro, realmente assim não me ocorre não, eu era bem pequena até, mas livros, como eu li de tudo, eu li tudo que eu pude de Shakespeare, realmente me atraía muito, eu gostava muito da questão teatro. Quase todos os clássicos, então Cervantes, fábulas, La Fontaine eu gostei bastante. Eu não ficava muito… nos brasileiros. Eu lia alguma coisa de Machado de Assis, alguma coisa de José de Alencar, algumas coisas assim, mas não me atraía muito, me atraíam mais os clássicos mesmo. Camões, e acabei lendo…Goethe, muita coisa até meio difícil para a minha época. Depois eu me fixei muito num filósofo, Humberto Rohden. Ele tinha sido um professor de religiões comparadas. Então o tipo de literatura dele é um tipo de literatura meio mística, muito filosófica, mas que acaba trazendo muito a religiosidade. Mas, não uma religião, a religiosidade, que eu acho que o meu ecumenismo nasceu justamente daí, porque ele citava muitas ideias de muitos líderes religiosos, mas nunca centrado em uma religião única. Então foi uma coisa que realmente norteou muito a minha vida. Humberto Rohden foi o principal.
Pergunta:
E esse período que você falou que teve cuidados especiais, ficou acamada, qual que é a idade…
Resposta:
Foi dos sete aos 14 anos.
Pergunta:
Quer dizer que você não frequentou a escola?
Resposta:
Não, nessa época eu ia à escola, não frequentemente, normalmente os meus amiguinhos da escola me traziam as lições em casa. Eu ia para as provas… não que eu fiquei totalmente desligada, então eu fui normal até o colégio, eu fiz todas as atividades normais, sem problema. Depois do colégio, depois dos meus 18 anos, é que realmente a minha mãe requeria uma atenção muito especial.
Pergunta:
Você já estava plenamente curada daquilo que te foi…
Resposta:
Sim, a parte física completamente em ordem.
Pergunta:
Era uma questão física então?
Resposta:
Era uma questão física. Eu tinha problemas renais sérios, o que eu diria que hoje era um problema de autoimunidade, então algumas infecções, isso tudo eu superei. Problemas glandulares, isso eu consegui superar.
Pergunta
E entre esse período que você realmente voltou à sua rotina e os cuidados com a sua mãe, você não estava ainda no mercado de trabalho?
Resposta:
Não.
Pergunta:
Você estava estudando….
Resposta:
Sim, eu estava estudando.
Pergunta:
Estava estudando, aí teve essa questão…
Resposta:
O problema dela foi se agravando gradativamente. Então, quando eu tinha mais ou menos os meus 18 anos, ela não conseguia sair à rua sozinha. Ela se alimentava sozinha, fazia algumas atividades. Ela tinha certas coisas que dava uma certa independência. Mas ela tinha muito medo, como o problema era psíquico, então ela tinha como se fosse uma perseguição constante. Então tudo para ela trazia um perigo iminente. Então o que acontecia, eu tinha que estar sempre por perto. [10’] Então nessa época eu fui fazendo artesanato, que eu gostava demais, então eu fazia coisas muito demoradas, tapeçaria enorme, elaborava roupas, eu trabalhei muito com roupas, mas muito elaboradas, com bordados, com apliques, roupas de bebê, fazia bastante.
Pergunta:
E você vendia isso?
Resposta:
Vendia, eu tinha…
Pergunta:
Era uma atividade financeira.
Resposta:
Sim, isso era uma atividade financeira. E eu inclusive fiz, até alguns cursos eu fazia. Quando meu pai chegava eu ia fazer meus cursos, mas eram coisas mais rápidas. E quando ela passou a ter internações constantes, aí sim, aí eu não podia realmente nem me preocupar com algum estudo, alguma coisa. E teve uma época que realmente nenhum trabalho eu poderia fazer.
Pergunta:
E o seu pai, fala um pouquinho dele.
Resposta:
Muito pai era uma pessoa assim, muito boa, muito dedicada e muito trabalhador. Ele sempre trabalhou em metalúrgica, ele era o que chamavam na época de retificador ferramenteiro. Então ele elaborava o final de toda a produção, não só de carros, mas de máquinas, de prensas. Então ele fazia aquele final, vamos imaginar que uma pessoa quisesse um logo metálico. Então ele iria criar o dispositivo que era colocado na prensa para fazer aquele logo. Então ele era altamente especializado, então ele tinha muito trabalho, e era muito voltado para as atividades dele. Mas ele era sem muita iniciativa para a questão da saúde dela, ele não sabia como lidar, então eu também fui obrigada a aprender muito com isso. Então hoje eu consigo determinar certas coisas, verificar certas coisas nas pessoas que me rodeiam, justamente por essa convivência.
Pergunta:
E como foi neste momento que você citou que você acabou chegando ao IMES, para preencher uma vaga temporária, uma necessidade pontual, mas como surgiu isso, quer dizer, você já conhecia o IMES, alguém te chamou, como que você você sair de casa…
Resposta:
Então, chega a ser engraçado. Na verdade, eu conhecia o IMES de nome. Nunca tinha nem entrado aqui dentro. Nunca me passaria pela cabeça estudar aqui por causa dos cursos também, eu não faria nenhum dos cursos que tinham na época, era só administração, economia, comércio, e estava começando informática. Então eu não faria, eu nunca tinha tido nenhum…mas tinha uma moça que trabalhava aqui no pós-graduação que ela era secretária de uma igreja que eu frequentava. Então, nessa época, ela estava procurando alguém para ajudá-la no pós-graduação, porque a outra companheira do trabalho iria se afastar e não tinha mais ninguém para ficar com ela. Então eu fiquei sabendo por um padre se eu me interessava: ‘Ah, você está disponível agora, te interessa?’. Porque a dificuldade de conseguir pessoas era porque o trabalho era noturno, a gente saía na época onze horas da noite. Muita gente não queria. Muita gente estudava à noite, então não poderia também. E foi aí que eu aceitei: ‘ah, eu estou disponível, eu vou’. Eu gostei do ambiente e tal, mas fiz os dois meses tranquilamente, nem esperava que eu iria voltar ou não.
Pergunta:
E quem que era a pessoa, você…
Resposta:
Era a Maria Celina. Ela trabalhava junto com a Neusinha do pós-graduação, como ela era conhecida, do antigo CEAPOG.
Pergunta:
A Neusa já estava aqui?
Resposta:
A Neusa já estava aqui. Já fazia acho que uns dois ou três anos que a Neusa estava aqui.
Pergunta:
O sobrenome da Neusa você lembra? Neusa…depois eu vejo direitinho, é só para a gente não se confundir com a outra Neusa, a Neusa da gestão.
Resposta:
Eu acho que ela era Aparecida Marques, se não me engano.
Pergunta:
Eu vou confirmar direitinho. Então ótimo, você chegou, veio fazer aquele trabalho, como foram esses dois meses?
Resposta:
Ah, foi muito gostoso! Porque antigamente, como o pós-graduação era muito pequenininho, então você tinha um contato direto com todos os alunos e todos os professores, e você já criava um vínculo com aquele pessoalzinho muito direto, era muito gostoso. Então era um trabalho mais de atendimento do que um trabalho burocrático. A gente tinha alguma coisa burocrática para fazer, mas a maior parte era realmente o atendimento. Ir até as salas de aula também, colocar as listas de presença, levar alguns recados, fazer alguma coisa que às vezes o professor pedia, então estava em contato direto com os alunos e os professores.
Pergunta:
Eu entrevistei, eu não me recordo quem agora, mas… falar da pós. A secretária fazia até a chamada, né? [15’]
Resposta:
Sim, muitas vezes sim!
Pergunta:
Ia com a lista e fazia a chamada…
Resposta:
Sim, já chegamos a isso. A chamada normalmente era assinada. Então a gente passava, o pessoal assinava a lista e a gente já recolhia.
Pergunta:
Onde ficava fisicamente ali a pós-graduação?
Resposta:
A pós-graduação ficava onde hoje é a reitoria. Então naquelas salas de cima, onde tem a reitoria, que tem a contabilidade, compras, tudo ali, ali eram as salas.
Pergunta:
Hoje a gente chama aquele espaço de prédio C. Qual que era a denominação naquela época?
Resposta:
Eu acho que já era…não, era o prédio do CEAPOG.
Pergunta:
CEAPOG.
Resposta:
Era o CEAPOG. [risos]
Pergunta:
CEAPOG você lembra por que CEAPOG, a sigla?
Resposta:
Não, não lembro.
Pergunta:
Se não me engano era Central de Pós-Graduação…
Resposta:
Era alguma coisa semelhante, mas realmente não me fixou.
Pergunta:
Perfeito, você ficou lá esses dois meses, e você estava dando sequência quando eu te interrompi. E aí você voltou aos cuidados com a sua mãe novamente, e você retorna a USCS. Como isso se deu?
Resposta:
Ela voltou do interior muito melhor. Realmente ela teve um tratamento, um outro, que a gente diz que na parte psiquiátrica são difíceis os tratamentos. E os hospitais de interior são como fazendas, é uma terapia muito diferente. Então eles conseguiram fazer com que ela ficasse razoavelmente bem, mais ou menos equilibrada. Então quando eles me ofereceram mais aqueles cinco meses, eu estava pronta para vir e ela conseguiria ficar sozinha um tempo, talvez aquilo ia ser uma forma de ela também começar a reagir. Então eu vim, eu aceitei, e realmente aconteceu isso na época. Naquele período ela conseguiu realmente melhorar bastante e conseguiu dar continuidade nas coisas em casa, ela fazia algumas coisas, se ajeitava, e eu toquei o barco aqui.
Pergunta:
A gente está falando aqui de 1900…
Resposta:
Foi em 1987. Aí eu vim em janeiro de 1987, e aí foi assim, né? Era para fazer os cinco meses. Então em maio eu faria cinco meses. Então começaram a me oferecer lugares para eu ficar, porque tinham vários lugares necessitando de pessoas, naquele tempo não era concurso ainda. Não havia aquela obrigatoriedade do concurso. Então eu poderia ter ficado no departamento pessoal, eu poderia ter ficado na secretaria técnica, que a Leila também tinha me oferecido lá, e a antiga bibliotecária Odete me ofereceu a biblioteca. E eu amei a biblioteca, eu sempre gostei de livro, então eu fui para a biblioteca. Então em 13 de maio de 1987, aí sim, eu firmei um contrato fixo com a universidade.
Pergunta:
Esses seus cinco meses a sua atuação foi em que área?
Resposta:
Foi na recepção da diretoria.
*Fim da Parte 1 de 5*
Núcleo de Pesquisas Memórias do ABC e Laboratório Hipermídias
Depoimento de Claudia Conceição Bueno dos Santos, 59 anos.
São Caetano do Sul, 16 de novembro de 2016.
Pesquisador: Luciano Cruz
Equipe técnica: Ileane da Silva Ribeiro
Transcritora: Bruna Moura
Pergunta:
E como era trabalhar nessa…
Resposta:
Ah, ali também era muito gostoso. Na realidade, aquela era uma recepção central na época. A gente ficava situado no subsolo, onde hoje tem um laboratório de informática.
Pergunta:
No pátio do prédio B, né?
Resposta:
Isso. Então lá embaixo tinham as salas da diretoria, tinha central de compras, contabilidade, sala dos professores, tinham várias coisas ali embaixo. Então, na realidade, eu dava um atendimento geral para todos que vinham procurar algum desses departamentos, e também alunos que vinham atrás de professores. Então era muito comum o contato com o aluno que sentava ali e falava: ‘vou esperar o professor chegar’. Então ficava ali na recepção esperando que o professor passasse, aquela coisa toda. Então a gente ia pegando amizade também, você acaba conversando, você acaba pegando vínculo com eles também, com os professores também, que às vezes deixavam recado, se a esposa ligasse, se estava acontecendo algum problema, então a ligação era muito próxima, e isso com todo mundo, chefes de departamento, todo mundo passava ali por alguma coisa, para pegar correspondência, então era a central de comunicação geral ali.
Pergunta:
E aí você chega na biblioteca.
Resposta:
Aí eu chego na biblioteca.
Pergunta:
Como foi esse início aí na biblioteca?
Resposta:
A biblioteca era, vamos dizer assim, minúscula, pelo que a gente vai comparar hoje. Então quando eu cheguei na biblioteca, ela tinha por volta de cinco mil livros, atualmente nós temos por volta de 120 mil. Então eu diria assim, que esses livros foram praticamente passados todos pelas minhas mãos em alguma oportunidade, ou para etiquetar, ou para carimbar, ou para digitá-los, seja o que for, em todos os momentos eles passaram pela minha mão para guardar, aquela coisa toda, né? [20’] Então esse crescimento foi muito importante para mim, foi muito bacana. Eu tinha, de novo, eu tinha todo o contato direto com alunos, com os professores que frequentam a biblioteca. Na época, por ser pequena, quase todo mundo frequentava, quase todo os alunos, quase todos os professores, e a frequência era muito maior do que hoje, porque naquele tempo o pessoal não tinha outra forma de pesquisa, era livro, era revista, eram jornais, e eles tinham que estar diretamente com a gente o tempo todo. Com o advento da informática, isso caiu vertiginosamente, porque tem acesso em casa, muitas vezes, ou até na rua por causa do celular, aquela coisa toda, então os livros ficaram um pouquinho de lado. Mas naquele tempo não, a gente fazia pesquisa para o aluno, porque a biblioteca não era também de livre acesso, então eles tinham um balcão, chegavam num balcão e nos colocavam o que precisavam, e aí a gente tinha que pesquisar para eles, então isso era muito gostoso, e assim, a gente aprendia muito.
Pergunta:
O aluno chegava e: ‘ah, eu quero saber algo sobre contabilidade. Eu tenho esse trabalho aqui de matemática financeira’.
Resposta:
Exatamente, a gente ia…
Pergunta:
Não falava a obra nada, vocês iam…
Resposta:
Às vezes eles podiam buscar nas fichas, mas era muito raro, porque a maioria, eles vinham com o assunto, então a gente tirava da prateleira para às vezes uma quantidade muito maior de livros do que ele precisava, mas eles tinham lá, o acesso. E quando era muito específico, realmente eles não teriam como fazer aquilo no arquivo de fichas, porque o arquivos de fichas vai colocar o assunto objetivo, direto, mas dependendo do que ele pesquisava, ele não ia conseguir ali. Então a gente tinha que pesquisar para eles e às vezes falar: ‘olha, hoje eu não consigo para você, volta amanhã que a gente vai tentar levantar o material’, e aí a gente deixava separado, muito comum. Revistas e livros, a gente já achava e deixava até marcado, então a gente estava fazendo pesquisa diretamente com o aluno o tempo todo.
Pergunta:
Nessa época, quantas pessoas atuavam na biblioteca?
Resposta:
Ah, nós éramos em três. Depois foi crescendo, gradativamente foi crescendo um pouquinho, mas assim, ao longo do tempo. Depois chegamos a cinco, e assim, pessoal específico para a biblioteca sempre foi muito complicado, porque na função da instituição seria um bibliotecário e um auxiliar. Isso era o que era estipulado e os demais…e na época os cargos também eram diferentes, a gente tinha cargos de datilógrafo, escriturário, auxiliar de secretaria, quer dizer, eram cargos assim de escritório, de um outro tipo de jeito, então para a biblioteca estavam os mesmo cargos também, então isso sempre foi uma dificuldade para você ter pessoal específico, então você treinava cada pessoa que vinha. Então eu fui treinada pelas duas que estavam ali, que eram bibliotecárias, uma estava como auxiliar e a outra como bibliotecária, e elas foram me treinando. Eu nunca pude fazer biblioteconomia porque na época não abriam turmas no período matutino, eu trabalhava à noite, ou eu saía daqui para fazer biblioteconomia ou continuava trabalhando na área. Então foi o que aconteceu, eu continuei, fui fazer psicologia porque eu tinha curso de manhã.
Pergunta:
E onde que ficava a biblioteca naquela época?
Resposta:
A biblioteca ficava no que seria o prédio C…vamos dizer assim, a princípio ela era um pedacinho do que seria hoje a sala dos professores. Depois, ela cresceu ali mesmo e pegou todo o espaço que tem aquela cantina, sala dos professores, ela pegou todo aquele espaço. Mas, a princípio, era só um cantinho, porque ali no prédio C tinha a cantina também. Então a cantina ficava de frente para a porta da biblioteca. Então não tinha…depois com a reforma, porque foi feito o teatro…
Pergunta:
Não tinha o teatro?
Resposta:
Não tinha o teatro. O teatro saiu muito tempo depois. A gente diz que foi puxando as coisas, elas foram crescendo daqui, crescendo dali, então foram se alterando. Mas ela era pequenininha, reformou-se uma vez e fez-se maior, depois reformou-se novamente para fazer maior ainda, até ela ser retirada para o prédio D. [25’]
Pergunta:
Da biblioteca para chegar ao seu antigo trabalho, a CEAPOG tinha aquela escadinha como tem hoje para ir para a reitoria ou não, como que chegava na biblioteca?
Resposta:
Não, a biblioteca era direto, você chegava, não tinha escada…não, não quer dizer, a escada tinha sim, saindo do espaço da rua tinha…
Pergunta:
Aquela escadinha.
Resposta:
Aquela escadinha.
Pergunta:
Você deu um bom panorama da biblioteca, né? Como era a biblioteca ali em meados de 1987, por ali. Me fala um pouco do IMES. O que era o IMES no finalzinho dos anos 1980.
Resposta:
Olha, ele era uma faculdade bem conhecida, a gente percebia que ela tinha um bom nome realmente, porque nós tínhamos muitos alunos não só do ABC. A gente tinha alunos de São Paulo, ela era uma faculdade bem cotada. Eu diria que os alunos eram muito bons sim, porque a gente tinha um contato tão grande com eles pelas pesquisas que eles faziam, principalmente o pessoal do curso de economia, eles era excepcionais. A gente percebia o tanto que eles eram dedicados, o tanto que eles realmente se esforçavam e faziam monografias maravilhosas. Então era uma época que a gente sentia um nível muito bom de trabalho, de pesquisa, de alunos interessados, e não era um vulto tão grande de alunos, porque o espaço físico, quando eu vim para cá…agora eu estou lembrando quando você me fala de ABC, não, na realidade ali não era o prédio C. Ali deveria ser o prédio B, porque o prédio A só foi construído depois, [risos] agora que eu estou me localizando [risos]. Realmente tinha isso, então era só onde é o prédio B hoje que era o local de aula, então ele era realmente pequeno. Mas, de bom nível. Nós sempre tivemos uma biblioteca boa, porque embora pequena, era pertinente aos cursos. Daí ela foi crescendo cada vez mais e nós começamos a receber também muita doação. Isso foi um intercâmbio que nós começamos a fazer também com DCE, com alunos, porque os alunos procuravam literatura, e como aqui não tinha nenhum curso voltado para a área, então nós não comprávamos esses livros, nós começamos a ganhá-los. Hoje nós vamos dizer assim que a nossa parte de literatura é um dos maiores fortes, realmente, e a gente continua ganhando muito. Então o IMES nessa época realmente já era muito bom. Incontestavelmente a fama dele tinha sido já bem feita e a gente percebia que muitos professores, não só daqui, muitos alunos que hoje são professores aqui, são professores em outros lugares, e professores de outros lugares foram aqui que se formaram.
Pergunta:
Você falou da questão da religião é até uma das responsáveis por você estar na USCS, você ficou sabendo da vaga por um padre…
Resposta:
É, foi por um padre.
Pergunta:
Onde uma amiga sua frequentava a igreja. Como que surgiu essa questão da religião na sua vida e como que isso, você até, em algum momento, citou essa questão do ecumenismo. Fala um pouquinho disso atrelado a sua vida.
Resposta:
Olha, na realidade, por eu ter lido muito e principalmente muita filosofia, muita coisa assim, eu não tinha realmente uma religião, e eu tinha muitas ressalvas com relação à religiões. Então eu não frequentava nada, até mais ou menos os meus 24 anos de idade. Nada, eu nunca tinha feito nem primeira comunhão, sei lá, nada nada nada de religião nenhuma. Mas um dia, eu fui a uma missa, uma missa da morte do meu avô, fui por obrigação. Meu avô faleceu, aí a família é católica, faz missa, e eu fui à missa, e me chamou a atenção o que o padre daquela missa falava. E, naquela época, era muito forte ainda, a questão da teologia da libertação, e esse padre era um padre engajado nisso, e eu gostei das coisas que ele falou, porque na realidade ele se preocupava muito com a situação de povo, com a situação de país, com a situação de mundo, e queria que as pessoas se unissem mais, se irmanassem mais, não importando tanto rótulos, mas ideais. [30’] E ele ainda acabou dizendo isso, na tal da igreja, ele falou: ‘eu não sou o padre dessa paróquia. Eu estou aqui substituindo um padre, e a minha paróquia fica no bairro de Santa Teresinha’, que por acaso era o bairro que eu morava. Me chamou a atenção e eu comecei a ir às missas desse padre.
Pergunta:
Qual é o nome dele?
Resposta:
Ronaldo Rocha. E realmente eu acabei me engajando, eu acabei conhecendo. Aquela igreja, ela era a igreja que fazia parte de um seminário aberto. Então, muitos seminaristas moravam ali, o pessoal tinha a casa dos seminaristas, eles atuavam diretamente com o povo, eles iam para seus cursos, para suas faculdades, essas coisas todas, mas eles não ficavam em um seminário fechado, eles ficavam trabalhando com o povo. Então era muito comum a gente juntar o povo na praça, pegar um violão, sentar todo mundo no chão e cantar, e trocar ideias, e fazer um gingado com aquele povo. A gente percebia o tanto que aquelas pessoas precisavam colocar as suas ideias, precisavam ter alguém que as escutasse, então nós aprendemos a fazer muita missa campal. A gente juntava várias igrejas para se reunir em uma determinada praça que fosse maior. Então todo mundo caminhava para essas praças, então vários padres, vários grupos comunitários, e aí a gente fazia aquelas missas campais, sempre as pessoas se unindo e, com isso, não atraía simplesmente católicos. A gente sabia muito bem que pessoas de outras designações religiosas frequentavam, porque eles ouviam alguma coisa que tinha a ver com suas vidas reais, com seus problemas diários. O que fazer para a gente ter menos pobreza, ter menos falta de cultura, por onde a gente começa, vamos fazer assim, grupos de bairro...vamos pedir para o prefeito que mude certas coisas aqui porque se a gente está precisando que essa rua tenha determinadas coisas, precisamos de uma escola, então as pessoas se uniam mais e iam batalhar por isso. Então foi aí que a religião me chamou a atenção, que eu passei a trabalhar nessa igreja junto com esses seminaristas. Então eu dava curso de batismo, catequese, eu dei curso de tudo que pudesse imaginar…crisma, sempre voltado para a teologia da libertação.
Pergunta:
A gente está falando aí de meados dos anos 1980, o Brasil estava aí num momento de abertura, chegou a ter algum…você falou da teologia da libertação, a ter algum problema com repressão…
Resposta:
Na verdade, na época a gente já não sentia mais tanto a questão da repressão, a gente já estava assim…1985, 1986, 1987, então nesse período já estava indo mesmo para uma abertura mais real, mas a gente sabia que era um período ainda de muitas greves, e a gente tinha Dom Cláudio Hummes, que realmente era quem puxava muito a questão da igreja católica na época, então a gente não estava mais…mas a gente conhecia muitas pessoas que sofreram repressões muito grandes no período de 1970 principalmente. Muitos padres, muitos padres que até não eram brasileiros, ou foram mortos ou tiveram que voltar aos seus países de origem, então isso a gente conhecia. Mas, eu particularmente, não senti nenhuma represália no tocante à questão da igreja em si. Não, era muito tranquilo. E era assim, era muito cultural tudo o que se estava fazendo, realmente as pessoas estavam muito emanadas.
Pergunta:
Voltando aqui para a universidade, fala um pouco de como foi essa trajetória então da biblioteca em especial, mas também da USCS como um todo, daquela instituição pequena, que ali basicamente o que hoje a gente conhece como prédio B e prédio C, aquela área da sala dos professores. Como que isso foi, aos poucos, sendo moldado na instituição que a gente conhece hoje, né? Quais são aqueles momentos que você destaca, as mudanças de prédio, fala um pouquinho dessa trajetória.
Resposta:
Nós fomos sentindo assim as mudanças, a minha primeira, vamos assim dizer, foi com a aprovação do curso de informática. Foi realmente a primeira vez que eu trabalhei numa aprovação de curso. [35’] A gente sabe que, normalmente o curso começa e que vai se batalhar para realmente ele ser aceito, para ele ser aprovado realmente, então aí tem todo um processo onde a biblioteca tem que acompanhar todas as necessidades e todos os departamentos em si tem que acompanhar as necessidades do curso. Então essa parte da informática, acredito eu que foi um dos fortes para a mudança, porque foi um curso que precisa também de laboratórios, então espaço físico foi sendo mais necessário, então fomos, foi começando a crescer, a necessidade do prédio A foi daí. A gente tinha um curso de Administração que cada vez requeria mais espaço porque tinha mais alunos, a gente sempre teve bastante aluno, né? E o da informática que, chegando ali também tão forte. Depois, as ideias da entrada do curso de Direito, o curso de Direito também foi um outro curso que realmente necessitou de uma expansão enorme, então onde a gente tinha uma biblioteca meio pequena, ela teve que crescer tanto que já não tinha espaço físico mais para ser onde ela estava. Então, a questão desses cursos que começaram a chegar, e a entrada também do Centro Universitário, ele já…vamos assim dizer, ficando algo maior, também com os cursos de comunicação que foram entrando, isso tudo foi requerendo que a instituição crescesse, fisicamente ela tinha que crescer. Então, há o crescimento do prédio A, já deu espaço para o crescimento de vários cursos que poderiam estar adentrando, mas depois havia a necessidade de uma biblioteca nova. Então aí o prédio D que acabou chegando também, tendo que dar o espaço. E hoje nós estamos praticamente sem espaço, de tão grande que nós estamos [risos]. Mas foi bem assim, tem horas que era bem parada, o crescimento era meio parado, mas existiam momentos em que foi um crescimento muito rápido. E eu acho que o que mais foi, foi o Direito, e depois a entrada dos cursos da saúde.
Pergunta:
Então a biblioteca sai ali daquela sala dos professores e vai já ali para o prédio D.
*Fim da parte 2*
Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS)
Núcleo de Pesquisas Memórias do ABC e Laboratório Hipermídias
Depoimento de Claudia Conceição Bueno dos Santos, 59 anos.
São Caetano do Sul, 16 de novembro de 2016.
Pesquisador: Luciano Cruz
Equipe técnica: Ileane da Silva Ribeiro
Transcritora: Bruna Moura
*Continuação do depoimento de Claudia Conceição Bueno dos Santos - Parte 3*
Pergunta:
Então a biblioteca sai ali daquela sala dos professores e vai já ali para o prédio D.
Resposta:
Sim, exatamente. Quando ela saiu da sala dos professores para o prédio D, ela já saiu informatizada praticamente totalmente, porque ela já era informatizada, só que a gente não tinha o empréstimo informatizado. Ela teve que ter sistema de segurança, porque aí existiriam os portais, ela passava a ser uma biblioteca de livre acesso, ela tinha que ter algum tipo de segurança, e também os empréstimos passavam a ser feitos via scanner, então tudo isso teve que ser feito ainda no prédio C, para já chegar no prédio D com essa estrutura montada.
Pergunta:
Queria que você explorasse um pouquinho mais isso. Então você citou como um dos destaques a entrada do curso de computação, da área de computação, e acredito que, também com a área de computação, a própria informatização da universidade tenha aumentado, porque você está trazendo computador para o laboratório. Fala um pouco como foi isso, como foi a chegada do computador no IMES e mais de perto na biblioteca, que você estava ali acompanhando dia a dia.
Resposta:
Na verdade, quando nós começamos a ter o nosso sistema e ele ter que ser, de uma certa forma, integrado, o nosso sistema não era da casa, o que nós tínhamos era o suporte da EDS, então esse suporte volta e meia caía, era ainda um sistema bastante obsoleto, vamos assim dizer, aqueles servidores grandes que estavam lá, a gente tinha aquelas…como é que vou dizer, nem sei como chama, onde tem os drives, os disquetes eram enormes, então tudo o que a gente tinha de problema, ou qualquer coisa, a gente tinha que entrar em contato com a EDS. E, mesmo o nosso treinamento, era feito pelo pessoal da EDS.
Pergunta:
Empresa na época vinculada à GM?
Resposta:
Exatamente, então nós tínhamos que já estar colocando cada material que chegasse era colocado no sistema. Ele ficava já alimentando os dados ali, só que era também de uma forma mais rudimentar. Tipo assim, eu tinha um livro, se eu recebesse um outro livro igual, eu tinha que digitar todos os dados dele novamente para que ele entrasse ali como um segundo exemplar. [40’] Hoje, a gente já coloca 50 lá direto sem problemas. Então realmente o sistema era lento porque era o que estava surgindo na época. Então nós tivemos que ser adaptados para a situação, e toda a biblioteca com o tempo teve que crescer e ir se adaptando. Os empréstimos a gente fazia via sistema, mas não da forma que é hoje. Então a gente já tinha eliminado fichinhas para alguma coisa, não tinha que escrever mais nas fichinhas. Mas, criava-se algumas dificuldades porque, se o aluno atrasava, tinha mais dificuldade para você…se você fizesse alguma coisa errada, vamos supor que colocou para sair naquela data, saiu na data errada, o aluno estaria atrasado e você não teria como negociar aquela coisa. Então sempre havia um problema mais difícil para você resolver.
Pergunta:
Não era flexível?
Resposta:
Não era flexível, exatamente, então realmente esses ajustes foram vindo de acordo com o tempo até que, para a mudança da biblioteca para o prédio C para o prédio D, aí sim nós trocamos também de sistema. Aí foi comprado um sistema, que se chama Informa, ele ainda é até hoje o mesmo sistema, que é de uma empresa do Rio de Janeiro, mas que ele nos supre bem as nossas necessidades, dá para trabalhar legal.
Pergunta:
Bom, a principal diferença que você citou é que no comecinho a biblioteca ela não era circulante, né? O aluno levava o livro, ele podia ficar com o livro…o prazo era o mesmo assim, uma semana?
Resposta:
Sim, normalmente uma semana.
Pergunta:
Só que ele não escolhia, aí teve a novidade de passar a ser circulante, né?
Resposta:
Sim, ele vai no acervo, ele mexe nos livros. Na verdade, é muito melhor. Toda biblioteca de livre acesso, o que que acontece, é um pouco mais trabalhosa para a gente organizar os livros na prateleira, porque eles mexem e tiram fora do lugar. Mas, em contrapartida, o aluno vai com um tipo de livro, ele vai, procura no sistema e descobre um livro. Quando ele chega na prateleira, ele vai achar N livros semelhantes, então ele tem a chance de escolher entre eles. Sem contar que, quando ele está passando e olhando, ele acaba vendo coisas e falando: ‘nossa, eu nem imaginava que tinha isso, era uma coisa que eu sempre quis ler’. Então a vantagem da biblioteca de livre acesso é que dá a oportunidade da pessoa descobrir o que ela gosta. E não criar aquela coisa rançosa de: ‘todo livro é chato’. Não, cada leitor gosta de um tipo de leitura, não existe coisa chata. Existe que às vezes a forma de você se expressar, você não conseguiu achar aquilo que você gosta. Então hoje, por exemplo, a gente sabe que muito aluno não gosta de ler, mas quando a gente oferece um livro em história em quadrinhos, ele fica apaixonado, e ele passa a ler outras coisas depois. Então o fato de ter o livro em história em quadrinhos, e quando eu falo o livro, é livro mesmo, e o pessoal não sabia que tinha essa possibilidade da gente ter. E aí a gente agradece ao Roberto Elísio que quis se dedicar a só isso [risos], mas faz muito gente ler, e ler bastante depois.
Pergunta:
Continuando nessa trajetória, tem esse ponto que é a mudança para o prédio D, e acredito que tem algo que mexeu com todas as áreas que o IMES, até então não sabia o que era isso, que foi o fato da gente ter uma segunda unidade, quer dizer, um novo campus, né? Como foi para a biblioteca ter que lidar com essa questão, já não é mais a única biblioteca aquela do campus Barcelona. Passamos a ter uma outra biblioteca no campus Centro. Como foi que funcionou essa origem e como que funciona essa integração dessa duas bibliotecas?
Resposta:
Na realidade, foi assim uma situação bastante complicada, porque quando entraram os cursos da saúde, nós não tínhamos espaço físico para a saúde no nosso campus aqui. Então foi criado um espaço que foi ali no (COP) como eles chamavam, na Estrada das Lágrimas, exatamente, aquele espaço ficou apenas para alguns cursos de saúde e uma pequena biblioteca meio rudimentar, que na realidade o que que nós fizemos, nós fizemos o trabalho aqui na central, como a gente chama hoje, e os livros foram retidos para lá, tendo uma pessoa que cuidava do acervo ali só para empréstimos, só para guardar o material. [45’] Então todo o processo físico do material feito na central. Depois que se criou a segunda unidade realmente lá na Rua Santo Antonio, então nós fizemos uma grande mudança. Uma coisa assim, tremendamente complicada, mas bem grande, que foi a transferência de todos os livros de Direito, já que o curso de Direito foi para lá. Então os cursos da saúde saíram ali da Estrada das Lágrimas, foram para a rua Santo Antonio, então material de Saúde para lá, e o material de Direito saiu daqui para lá. Então aí sim, tinha uma bibliotecária que ficava ali com alguns funcionários recebendo o material, na época tudo pronto, para colocar nas prateleiras. E aqui a gente mandando para lá o que era esse material todo. E depois, recebendo as novas compras, tanto de Direito quanto Saúde, sempre as compras são recebidas aqui na Central, e aí é mandado para lá. Na medida do possível, algum material às vezes era mandado para lá e a bibliotecária de lá processava, só que com o falecimento daquela bibliotecária, nós estamos com bibliotecários temporários, então na maioria das vezes a gente processa todo o material aqui e manda pronto para lá, e lá o pessoal só armazena, e tem algumas coisas que eles recebem ali e tentam processar na medida do possível alguma coisa ali, mas, normalmente, a coisa fica na central, todos os pedidos de compras vem para a central, e aqui a gente procede a compra, o recebimento e também todo o trabalho deles, inclusive até encapar, porque isso é uma coisa inédita de biblioteca. A nossa, todo o nosso material é encapado. Em bibliotecas que a gente anda por aí realmente não é feito esse processo. Aí muita gente começa a falar: ‘mas há necessidade?’. Não é obrigatório, só que a conservação do livro é muito grande. Então, se o livro tem a capinha mole, a gente coloca um contraforte e encapa esse livro, a durabilidade dele é muito grande, então o nosso material é muito bem cuidado. Então, tanto num campus quanto no outro, sempre vai estar tudo encapadinho, tudo ajeitadinho nesse ponto.
Pergunta:
Você citou a questão do curso de psicologia, como que foi esse momento de voltar aos bancos escolares?
Resposta:
Olha, eu não senti nem praticamente como uma volta, né? Porque eu fui sempre uma pessoa que estava em contato com isso o tempo todo, desde o tempo que eu lia muito, até o tempo que eu já estava aqui trabalhando. Quando eu voltei a estudar, eu já estava há uns cinco anos aqui na universidade, então já foi um processo que eu estava meio habituada com o ambiente, então foi muito gostoso, foi muito prazeroso, a verdade é essa. Houve um acréscimo, mas nem tanto assim. Porque, na realidade, tudo que eu acho que mais aprendi não foi o que eu aprendi na faculdade, foi mais o que eu vivi. Então, quando eu estava fazendo psicologia, eu sentia muito isso, que a maioria dos meus professores, eles tinha muita teoria, mas eles não tinham prática. E eu tinha uma prática hospitalar muito grande.
Pergunta:
Por conta da sua mãe.
Resposta:
Exatamente, então o fato de eu ter convivido com uma pessoa com problema, ter enfrentado mil tipos de hospitais diferentes, muitos profissionais diferentes, eu tinha uma experiência tão grande que, quando os professores me relatavam certas coisas, e quando havia muito briga, se tinha que acabar todos os manicômios, eu sempre cheguei a conclusão que deveria ser transformados, não acabados. Não existe essa coisa de dizer eu vou romper com o hospital psiquiátrico, porque realmente ele era uma forma de enlouquecer as pessoas, mas ele tinha que ser transformado, se ele fosse realizado na forma que eu vi nesses hospitais aqui de Piracicaba que tem alguns, de Itapira e tal, se tivessem aquele tipo de estrutura, então eles dariam realmente uma assistência muito grande, tanto para o paciente, quanto para a família. Porque, na realidade, toda a família que tem um doente psiquiátrico, ela precisa ser trabalhada. [50’] A pessoa precisa saber como cuidar de uma pessoa assim, que realmente é bem difícil. Então, na faculdade, o que eu tinha assim de gostoso, é que eu conheci muita gente, e eu acho que foi o único vestibular da Metodista que foi totalmente dissertativo. Eles fizeram uma experiência de fazer um vestibular dissertativo que foi difícil para eles corrigirem, aquela coisas, mas o que atraiu a maioria do pessoal que conseguiu entrar eram mais velhos, ou já eram formados. Então na minha sala tinham muitos pedagogos, fisioterapeutas, advogados, essa troca foi muito boa, porque o pessoal mais jovenzinho não tinha esse hábito de escrever muito. Depois eles eliminaram esse vestibular e nunca mais teve, então foi a única vez que teve, eu tive essa experiência que, para mim, foi muito melhor, porque a gente tinha o direito de escolher entre os idiomas, você podia fazer uma prova ou em inglês, ou francês ou espanhol, e eu nunca tive afinidade com o inglês, eu tenho afinidade com o francês. Então tudo isso para mim, parece que foi tão a calhar que eu não saberia nem te dizer, isso foi muito legal. Então a experiência ali foi bacana. Mas, hoje eu sei que também a maior parte dos cursos de psicologia são do jeito que aquele que eu fiz, muito voltado para a fisiologia mesmo. Então eu tive laboratórios iguais do que o pessoal hoje tem para educação física, então a gente tinha contato com as peças, com cadáver, tinha que ter uma série de coisas assim que, para mim, completamente natural, eu me sentia plenamente apta para qualquer coisa assim. E a gente lidava com animais, que hoje também eu sei que não é qualquer lugar que tem mais isso, então a gente tinha a questão de estar mexendo com o animalzinho, né? Na época os ratinhos, as cobaias, e eu tenho muita afinidade com animal. Então, eu teria muito jeito para ser veterinária, porque eles têm confiança em mim. Eu cuido de bicho que aparece doente, eu cuido, tranquilamente [risos]. Então isso é que foi a passagem para mim na faculdade. Foi bom, mas eu diria para você que não foi tudo não.
Pergunta:
Mas eu acredito que o que fez você optar pela Metodista é o curso matutino, né?
Resposta:
Sim.
Pergunta:
O fato do curso ser matutino você não encontrava no caso no curso de biblioteconomia, né?
Resposta:
Isso, porque eu teria feito mais pelo nível profissional, porque eu gosto da área, aquela coisa toda. Mas a biblioteconomia em si é um curso muito técnico, então de repente quando você está ali, você realiza uma série de coisas. Hoje, muita coisa está mudando, até mesmo dentro da biblioteconomia. A gente sabe que é até mais um sistema de informação , então o curso de sistemas de informação, ele poderia estar mais acoplado. A gente sabe que tem a biblioteconomia aqui, tem o sistema de informação aqui. Um pouco das coisas que tem aqui e um pouco das coisas que tem ali, elas tem que se juntar. Existe alguns lugares que tem isso, mas ainda é pouco. Então o profissional precisa hoje estar voltado para as mídias, não tem jeito. Ele precisa ter conhecimento e utilizar essas mídias. Eu amo o livro físico, mas eu tenho meu Kindle e vou dizer para você que é muito prático, porque um livro pesado me cerceia de onde posso lê-lo. Eu preciso estar numa mesa, alguma coisa legal, para poder estar lendo. Agora, com um Kindle que ele é levinho, eu posso ler no ônibus, eu posso ler no avião, em qualquer lugar, ele é tranquilamente fácil de carregar também, não ocupa espaço. Então a gente também tem que ver que, em certos momentos, a biblioteca vai ter que mudar para isso também. Então uma das coisas que seria também uma necessidade já na USCS, a gente ter vários Kindles também e não emprestar mais livro, emprestar Kindle.
Pergunta:
Essa é uma pergunta que eu queria te fazer e queria que você desenvolvesse um pouco mais. Como que é essa biblioteca do futuro, ou como que é essa biblioteca já do presente, quer dizer, como que é esse próximo passo, você citou no começo que viu que os livros já não tem uma procura tão grande. Qual que é a tendência que você vê que e quais serão os passos a ser dados nessa área, não só na USCS? [55’]
Resposta:
Olha, já está saindo em muitas partes do mundo, e normalmente não são bibliotecas universitárias, mas eu acho que a gente poderia fazer isso aqui. A biblioteca não ser mais o espaço para os livros, ou só para a cultura voltada à livros, revistas, e sim um local, como se fosse um local para se relacionar, um ambiente de relacionamento. Em muitos lugares já se tem o café, uma lanchonete na biblioteca. Um espaço com aparelhos musicais, piano, uma bateria, aí você vai falar: ‘nossa, mas vai fazer barulho’. Não, biblioteca em silêncio não existe mais, porque até a nossa tecnologia é barulhenta. Então a gente tem maquininha de imprimir que faz um barulhinho enorme, catraca, que tem um barulho enorme, tem o controle de sinais ali que também é muito barulhento, as pessoas falam muito. Então esse negócio do silêncio já se apaga. A gente poderia ter um espacinho realmente acústico, para as pessoas que querem se concentrar e todo um espaço voltado para se confraternizar. Muitos sofás, muitos puffs, sabe? Almofada no chão, cantos com gibis, cantos com revistas, coisas, brinquedos, coisas lúdicas, jogos. Já me pediram isso, xadrez, dama, ter todas essas coisas. Se ninguém vai usar, você deixa, e você só desenvolve isso. E a gente sabe que o pessoal vai para se encontrar. Hoje mesmo me abordaram com um problema que está acontecendo de manhã. Vários alunos, eles vão para a biblioteca, tem dois sofás, senta um grupo inteiro naquele sofá e ficam batendo papo. Eles querem bater papo. Aí me perguntaram: ‘tenho que mandar calar a boca? Tem que mandar embora?’. Eu acho que não! ‘Mas atrapalha o outro grupo!’ Então…o que falta são as salas acústicas. Isso eu vi na PUC de Curitiba de uma forma maravilhosa. Salas para grupos, totalmente acústicas, e salas para pessoas individuais, também acústicas, que vão ali escrever sua tese, que realmente precisa de um espaço porque ele vai levar o laptop, vai fazer a coisa dele, mas é lugar fechadinho, isoladinho, que não atrapalhe. O resto, é cheio de mesas, cadeiras e sofás, sofás, sofás, e muita obra de arte em volta, vitrais. Um ambiente bonito, sabe? Um ambiente com plantas, tudo isso atrai.
Pergunta:
Claudia, você citou há pouco o Roberto Elísio, sobre as indicações das HQs, né? Queria que você falasse um pouco como funciona as novas aquisições da biblioteca. São os professores, o público que pede, são aqueles lançamentos mais vendidos que norteiam alguma compra, como que isso funciona?
Resposta:
É, o normal da coisa é realmente as indicações dos professores, porque os professores realmente têm que nos indicar e não tem como a gente elaborar todo o material que é pertinente às matérias. Então existe a indicação dos professores, e nós da biblioteca fazemos indicações também, e as nossas indicações vão muito de acordo com a procura dos alunos. Então tem aluno que vem e traz um nominho de livro: ‘olha, se vocês foram comprar uma hora, compra esse livrinho?’. A gente faz isso, porque na realidade, é interessante a gente ter certas coisas que vão atrair o leitor. Uma das coisas que facilitou muito as compras mais diferenciadas é o curso de comunicação, porque, para Jornalismo, você precisa ter tudo. E, se existe um curso que usa livro religioso é o curso de comunicação, ou por publicitário ou jornalista, eles usam, porque eles vão fazer algum programa, vão discutir algum assunto, e aí você vai dizer: ‘nós temos uma parte religiosa grande?’. Temos. A parte religiosa, na grande maioria, foi doada mesmo. Nós temos o professor Renê, que é um padre e nos deu muitos livros, temos outros professores que são pastores e nos deram muitos livros; eu fiz todos aqueles encontros ecumênicos que ganhei livro à bessa, então a nossa parte religiosa também é grande, e a nossa parte filosófica também. [1:00’] Então isso é usado? Muito. E aí tem aquele aluno que vai comprar um livro porque a tese que ele está fazendo precisou realmente de um material que ele não vai usar depois, e ele vem e nos doa também. Então todo esse material é aproveitado.
Pergunta:
Tirando os livros técnicos, aquele que você falou da disciplina, aquele que o professor pede: ‘vai cair na prova’, deve ter uma procura mesmo, quais são assim os destaques, os campeões de procura assim, o que as pessoas procuram muito na biblioteca?
Resposta:
Bom, livro com personagem vampiro, não importa de quem [risos], romances espíritas também é muito procurado, coisas de super heróis, não só os HQs, mas alguns livros que realmente tem alguma coisa nessa área, livros de filmes ou que levaram a fazer filmes, então é muito procurado também: ‘olha, tem aquele filme, você tem o livro?’. Ou eles viram o filme e querem ler o livro, ou justamente ao contrário, eles querem ler primeiro, antes de ver o filme. Então isso acontece, aconteceu muito com Harry Potter, por exemplo, que foi campeão de audiência, Dan Brown. Esses aí saem muito. E assim, no geral, para determinados cursos, a gente vê que o pessoal de Direito gosta de livros que realmente tenha causas, julgamentos, qualquer coisa assim, que a gente compra e é muito usado. E às vezes até o professor pede também, porque é o exemplo de como é que eles vão trabalhar no julgamento, ou em alguma coisa assim. Então tem o pertinente ao curso, que é totalmente literatura, totalmente ficção, mas que pode ser usada. Kafka é muito usado tanto nos cursos de Comunicação quanto dos cursos de Direito.
Pergunta:
Claudia, você está na USCS, se eu fiz a conta certa, há 39 anos, é isso?
Resposta:
Não, vou fazer 30 anos.
Pergunta:
Vinte e nove anos?
Resposta:
Isso, 29 e uns trocos aí.
Pergunta:
Nesses 30 anos então, você deve ter uma série de curiosidades, histórias divertidas, ou nem tão divertidas, do dia a dia, de coisas que você acompanhou na trajetória da universidade. Você poderia citar algumas?
Resposta:
Olha, é muito interessante, principalmente o contato que a gente tem com esses alunos. Então de você ter muito contato com eles, você acaba conhecendo até a vida muitas vezes. Se você está no balcão, hoje eu não fico tanto tempo no balcão, eu tenho muita atividade fora do balcão, mas quando a gente fica bastante tempo no balcão, você está atendendo um aluno, mas você tem o outro que quer a sua atenção, então começa a puxar papo, ele conta a vida, e se ele fizer isso todos os dias, porque eles marcam realmente o ponto. Ele chega às seis, a aula dele é às sete e vinte e ele fica das seis às sete e vinte ali no balcão te contando as coisas [risos]. Isso acontece bastante. Então, cria-se um vínculo muito grande, porque a gente sabe que as pessoas, às vezes elas querem desabafar, às vezes elas precisam de alguém, então conforme elas recebem alguma atenção, elas vão buscar. Isso não é particularmente comigo, é com todo mundo que está na biblioteca. E a gente é escolhida também, de repente ele gosta de mim, só eu posso atender. Estou lá na sala dos fundos, a pessoa vai até lá e me pede alguma coisa. Ou a pessoa só quer ser atendida pela Rita, ela está ali na sala dela, eles vão lá na sala dela, porque tem essa coisa, a pessoa quer o vínculo. Então é muito interessante, às vezes até cria situações desagradáveis, tipo algum funcionário temporário, as pessoas amam aquele funcionário e ele vai embora. Aí eles ficam zangados com a gente, brigam até: ‘mas eu quero aquela pessoa!’. Então isso é uma coisa que acontece. Público tem essas coisas. Material, aluno é danado, matreiro, sem vergonha também. Então ele vai, ele leva um livro, está atrasado com o livro. Então o que ele faz? Ele enrola, ele passa por você. Apitou, ele fala: ‘olha, eu vou renovar o livro, daqui a pouco eu renovo’ . Aí ele vai e ele guarda o maldito do livro. Depois ele passa uns dias: ‘olha, eu devolvi o meu livro’. Devolveu? Mas aqui no sistema está constando que você está com ele. ‘Não, eu devolvi!’. [1:05’] Aí a gente pega o número do livro, vai até o acervo e acha o livro guardado. Só que eles acham que nós não demos baixa, mas pôs na nossa mão, a primeira coisa a gente faz é passar o scanner. Passou o scanner, apareceu lá, clicou? Sumiu do sistema. É pá, pum! Não tem como.
Pergunta:
Fora a câmera que mostra ele colocando o livro lá…[risos]
Resposta:
É que justamente na prateleira não tem câmera.
Pergunta:
Então a gente tem que editar para o pessoal achar que tem câmera [risos]
Resposta:
Ah, sim! [risos]
Pergunta:
Para o pessoal continuar achando que tem câmera. [risos]
*Fim da parte 3*
Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS)
Núcleo de Pesquisas Memórias do ABC e Laboratório Hipermídias
Depoimento de Claudia Conceição Bueno dos Santos, 59 anos.
São Caetano do Sul, 16 de novembro de 2016.
Pesquisador: Luciano Cruz
Equipe técnica: Ileane da Silva Ribeiro
Transcritora: Bruna Moura
*Continuação do depoimento de Claudia Conceição Bueno dos Santos - parte 4*
Pergunta:
Para o pessoal continuar achando que tem câmera. [risos]
Resposta:
Porque, na verdade, esse é o problema, eles são matreiros, eles sabem disso. Então, eu sempre sei. Se eles guardaram, se foi erro de sistema, porque às vezes pode ocorrer, na hora que você passa o scanner, ele lê uma coisa errada. Então aí ele vai dar como que aquilo não existiu, pode passar batido também. Então realmente a gente sabe. Mas o normal da coisa é eles realmente fazerem alguma coisa para eles não pagarem multa. E multa, também é assim, você pega, ele atrasa. Você manda uma cartinha, você manda e-mail, você liga na casa, ninguém te dá a mínima [gesto de desdém com as mãos]. Aí nos descobrimos que, quando a gente manda uma carta registrada, rapidinho eles aparecem, porque eles assinaram que receberam. Então, nem e-mail e nem telefonema, o certo é a carta registrada. Aí aparece. Só que aí faz um ano, ele tem lá 300 reais de multa. Nossa, aí é uma briga, uma choradeira: ‘eu não tenho para pagar isso’. Aí a gente tem que negociar, porque a gente não pode deixar por nada, porque afinal de contas ele pisou na bola, um ano sem devolver o material, ele pode ter prejudicado alguém que queria o material. De repente, o que mais acontece é isso. Então, não é o problema do dinheiro. O que a gente exige? Que ele faça doações, já que não tem o dinheiro para pagar, ele vai dar alguns livros para preencher aquilo. Aí ele já fica satisfeito. Aí depois ele atrasa de propósito, porque ele tem muito livro na casa dele e ele quer doar o livro [risos]. Então vai acontecendo umas situações que são hilárias até.
Pergunta:
Pode avisar os alunos que, quem quiser fazer doação pode fazer, não precisa atrasar. [risos]
Resposta:
Exatamente! Porque o que acontece, a gente ganha livro demais. Claro, se a gente já tem uma quantidade de exemplares, não necessita mais, e a gente ganha mais alguns, então a gente tem a mesa. Antes a gente tinha um lugarzinho para por doação, agora a gente tem uma mesa, porque é muita coisa que nós temos realmente para doar. Então a gente doa para os alunos. Se for alguma coisa que não é pertinente, a gente manda para outras escolas, para outro lugar, mas o normal é a gente dar para o aluno porque, até livro infantil, alguns tem filhos, aquela coisa toda, então vão levar. Realmente é bem funcional isso.
Pergunta:
Claudia, o que a USCS representa na sua vida?
Resposta:
Olha, realmente foi um prazer muito grande sempre estar aqui, porque foi o contraste da minha vida, porque eu ficava muito sozinha, cuidando de uma pessoa doente, aquela coisa toda, e eu sempre fui muito comunicativa, sempre gostei de gente, de movimento, então para mim, eu consegui me realizar, porque eu faço o que eu gosto, eu gosto do pessoal todo, e eu acho que eu sempre, é uma coisa que o pessoal sempre diz para mim, que eu estou sempre sorrindo. Realmente, eu estou sempre muito bem por estar fazendo o que eu faço. Então eu acho que a USCS realmente representa uma coisa muito importante para mim, uma das coisas mais importantes da minha vida. Eu vou dizer que é a mais importante? Porque a partir do momento que você tem um filho, ele acaba sendo uma das coisas mais importantes. Mas realmente ela sempre foi muito importante na minha vida, e para mim é uma prazer muito grande vê-la crescer, e as coisas que faltam ser transformadas, isso é uma coisa que eu realmente gostaria de contribuir para que sejam transformadas, para que cresça mais. Então, tudo que a gente tem ali que foi um trabalho grande para ter ali, o nosso prazer é ver quem use. Se ele fica parado, a biblioteca não tem função, se o material fica na prateleira. Nós já tivemos profissionais que trabalharam ali que não queriam que mexesse: ‘ah, estraga! Não pode emprestar muito os livros’. Comigo não tem muito limite de livro, eu empresto o que a pessoa me pedir, evidente, que a maioria que um ou dois, a maioria não quer muito mesmo. Mas, todo mundo sabe, um professor chega e fala para mim: ‘eu quero vinte, porque eu tenho um monte de pesquisa para fazer’. Leva! Não vai atrapalhar ninguém? Leva! [1:10’] Se alguém precisar urgentemente, a gente pede, não tem problema. Mas ele tem que ser usado, porque material ali, revistas, a gente não vê o pessoal usar as revistas e a gente tem revista acadêmica maravilhosa, e nada moderno está tão nos livros, as coisas mais atuais realmente estão em revistas, tem assunto que não adianta procurar em livro. E o material está lá só. Nós sentimos isso, que as revistas de altas tiragens, quer dizer, Veja, Istoé, essas saem, o pessoal lê. Mas as outras, que são muito mais importantes, não, são muito pouco usadas.
Pergunta:
Fale um pouquinho sobre a capela.
Resposta:
A capela! Realmente a capela foi uma coisa assim muito bacana de ter sido criada. Logo que eu vim para cá, eu lembro de alguns alunos que faziam culto e faziam missas aqui dentro. Eles se reuniam para orações e tal no pátio, eles realmente solicitavam que houvesse um espaço para eles se encontrarem, mas dentro da sua questão religiosa. Então, quando criou-se essas capelas, tanto no campus Centro quanto aqui, eu fiquei muito contente, porque eu percebi a necessidade que os alunos tinham, e alguns às vezes se reuniam até em cantinhos ali na biblioteca, a gente percebia que eles faziam certos encontros, e eles nem sabiam que existia um espacinho. E eu fui falar com o professor Renê, e eu falei: ‘professor Renê, eu posso divulgar esse negócio, porque o pessoal não sabe e de repente começa a usar. Então foi uma coisa muito bacana que foi criada aqui dentro, eu gostei muito de divulgar. Hoje, o pessoal acha que a capela é minha, porque eles sempre perguntaram se pode usar ou não pode, e o espaço é assim, é para usar. Realmente, é para usar. A única coisa que eu faço às vezes é ver se não tem conflito de horário para um não atrapalhar o outro, mas isso é muito raro de acontecer. Então, a gente sabe que costumeiramente sempre tem uns grupinhos utilizando.
Pergunta:
E como funciona isso? No campus Barcelona: ‘eu quero usar a capela’, e você tem agenda lá, alguém tem no Centro, como que funciona isso?
Resposta:
Então, no campus Barcelona o pessoal fala comigo. Eu não tenho uma agenda, porque não é tanta gente que usa, então tem alguns grupos que falam: ‘ah, eu vou na quinta’, o outro vai na sexta, os horários alguns são logo na entrada, outros é no intervalo, então não atrapalha. No campus Centro, normalmente o pessoal falava com o Jonas, ou quando a Renildes estava lá, a Renildes saiu, normalmente eles falam com o Jonas e ele dá uma controlada, mas também não tem assim muito conflito de horário não. Os grupos são poucos, mas funciona, está sempre tendo alguns que usam. Agora, os que nós tínhamos, nós tínhamos grupos grandes, esses só saíram da USCS, porque não cabia mais na capela. Então a gente tinha o grupinho do pessoal da SOS Jesus, que continuam indo lá na igreja deles, aquela coisa toda, mas muita gente não cabia. E o rapaz, o pastor, que vinha aqui, ele tinha dias, ele chegou a vir até três vezes por semana, mas quando o pai dele faleceu, ele foi obrigado a assumir a igreja do pai, aí ele não tinha mais tempo. Então eles realmente se voltaram para lá, e o outro grupo católico, que era muito grande, eram quase 80 pessoas, eles ficavam para o lado de fora, então realmente eles arranjaram um espaço maior, mas volte e meia a gente sabe deles com todo o carinho do mundo, porque eles nasceram aqui, cresceram aqui e o grupo está vingando aí para fora.
Pergunta:
Você organizou os encontros ecumênicos, né?
Resposta:
Sim.
Pergunta:
Fale um pouco dessa experiência aí.
Resposta:
Olha, foi muito gostoso também, porque eu fui visitar muitas religiões, então o fato de ter sido tão bem recebida em todos os lugares, pessoal do islã, super bem tratada, o pessoal judeu. Alguns eu não consegui trazer para cá por falta de oportunidade realmente, mas o pessoal budista é muito bacana, e o que eu trouxe foram várias pessoas, muitas delas eram pessoas vinculadas à universidade também, então nós tínhamos os professores engajados, antigo advogado, o pessoal que era da instituição, então eu procurei aproveitá-los para o pessoal conhecer que realmente tem pessoas aqui dentro de bastante cunho religioso e que elas poderiam estar conversando entre eles sem rincha nenhuma, e que, dependendo do que eu propunha para que eles falassem, eles pensavam a mesma coisa, na realidade eles queriam a mesma coisa, é aquela comunhão entre as pessoas, aquela união, uma paz, uma forma troca realmente, mas de um nível mais elevado. [1:15’] Então eu achei que foi realmente uma experiência muito boa. O que que me levou a parar? Porque realmente eu não conseguia atraí-los fora do horário de aula, e no horário de aula eles estão em aula. Então eu tive alguns encontros que tinham professores que realmente até tiraram os alunos da aula para assistir porque tinha coisa que era até meio pertinente, principalmente aos cursos de comunicação. Então, a Ana Claudia volta e meia levava o pessoal e divulgava isso, mas começamos a fazer como AACC, aos sábados e tal, mas parece que a questão foi o público, eles não queriam muito…trouxe gente de fora, e aí o pessoal vinha para assistir, mas não alunos, gente de outros lugares, então ficava bastante complicado até continuar um trabalho que não fosse bem veiculado para os alunos.
Pergunta:
A ideia era envolver o público interno.
Resposta:
Exatamente, mas foi uma experiência muito boa, eu fiz tanto aqui quanto no campus Centro, e aí foi que nasceu muito desses alunos que vieram utilizar a capela, porque eles começaram a vir conversar, e a gente deu a dica de eles continuarem atuando, fazendo algum trabalho, e que se eles quisessem algum encontro religioso maior, eu poderia até ajudá-los a como fazer, aí dependeria deles.
Pergunta:
Claudia, eu queria que você fizesse um paralelo entre aquela instituição que você conheceu aqui em 1987 e a USCS, agora próximo a completar 50 anos, o que mudou, quais são aquelas coisas que você sente, que são latentes a essa mudança, e o que não mudou, o que você ainda vê nessa instituição que temos hoje, lembrança aquela instituição de 1987 e que, paralelamente, você fizesse uma análise da própria Claudia, quer dizer, aquela Claudia que entrou aqui com 27 anos, né?
Resposta:
Isso.
Pergunta:
Com 27 anos, como ela amadureceu, como que foi esse desenvolvimento da Claudia e como ela se encontra hoje.
Resposta:
É [risos] meio complicado na realidade fazer um parâmetro tão grande. Eu acho que tudo na vida vai fazendo transformações, então se ficasse exatamente igual, estaria estagnado. Então a tendência realmente é transformar e, principalmente num ambiente universitário é crescer. Se ela tivesse ficado uma faculdade só com aqueles cursos, podia ser até que ela nem existisse mais, porque nós temos concorrência para todo lado também e alguma coisa poderia não vingar. Quando você tem um leque maior de opções, isso atrai muito mais gente e vai criando um outro público, uma outra situação. O que é diferente é que a gente tinha um grupinho pequeno, então você conhecia quase todos os alunos, conhecia todos os professores sim, quando a gente fazia uma festa, todo mundo se conhecia, então era muito família. Hoje, já é uma coisa muito grande, então tem muitos funcionários que eu não conheço, muitos professores eu não conheço. Antes era importante que a gente conhecesse, principalmente nós da biblioteca conhecermos todos os professores, porque a gente vai cutucá-los: ‘olha, precisa mudar tal material, está obsoleto’, ‘precisa por mais porque esse aqui não tem’. A gente às vezes nem sabe quem é o professor daquela área, a gente não tem tempo também de procurar. Então, algumas coisas se dispersam. Muitos foram embora para outros caminhos, veio os novos, e esses novos não se apresentaram. Então, nós estamos assim agora, no ar, porque existe algumas coisas de desconhecido dentro do nosso próprio ambiente. Mesmo a gente estando aqui há tanto tempo, e agora? Como é que eu lido com essa situação? Quem é essa pessoa dessa situação? Então essa coisa, por ser muito grande, fica mais difícil nesse sentido. E, aquilo que a gente quer mudar, por ser muito grande também é difícil. Então às vezes eu olho, dentro da biblioteca mesmo, tem N coisas que eu gostaria de remodelar. [1:20’] Só que como chega tanto material a cada momento, que eu não tenho tempo de remodelar aquilo outro, eu tenho que processar o que está chegando. Aí a gente tem várias opções de pessoas trabalhando, você tem monitores, você tem estagiário, e aí tem o funcionário e tal, então tem situações diferente também que te levam a trabalhar num esquema de rapidez sem poder se dedicar a certas coisas. Então, antes, dava para ter uma dedicação maior, hoje a gente fica mais disperso, e eu acredito que, não só eu, mas quase que todo mundo, porque você que está na comunicação, centra ali, mas a grande massa das pessoas você não consegue ver, você não consegue saber como é que está fluindo as coisas, como o que as pessoas estão vendo o que você está fazendo, por exemplo, não dá. Você não vai ter tempo de chegar ali e bater um papinho, e antes eu fazia isso. Eu ia na sala dos professores na hora do intervalo, era muito comum eu fazer isso: ‘oh fulano, sabe, está acontecendo isso e isso com a sua matéria’. Hoje, não tem nem como né? Primeiro que estou em outro campus, eu teria que ir para lá e tentar ver isso aí, aí a gente pode dizer: ‘pode criar um funcionário que faça isso’. Difícil, porque eu to há muito tempo, então eu conheço cada lance dessas situações. Eu consigo chegar no professor e falar: ‘olha, tem isso, tem isso e tem isso’. Mas eu não posso pegar um dos nossos monitores e fazer que ele faça isso. O máximo que eu posso fazer é quando um aluno me queixa de alguma coisa, eu conversar com esse aluno, e eu pedir para ele falar para o professor e ele se situar com ele, para que ele tenha conhecimento do que não está muito viável. Mas, eu não vou ter certeza do retorno.
Pergunta:
E tem algo que você ainda nota na essência que ainda está presente desde 1987?
Resposta:
Eu ainda acho que essa instituição tem muita gente que ama, é um negócio assim meio inexplicável, porque você começa a conversar com ex-alunos e eles falam: ‘ah, eu gostariam de voltar’. Aí você encontra um que está voltando e nós, que somos antigos, a gente permanece, claro, nós antigos a grande maioria já está com um pé na aposentadoria, muita gente fala: ‘ah, eu não sei se eu vou, ou se eu não vou’. Eu tenho essa indecisão, se eu vou logo, ou se eu espero mais um pouco, porque eu gosto do que eu faço, mas nós não vamos ser eternos, isso é verdade, mas essa é uma instituição que atrai muito isso, um sentimento muito grande. Não sei muito se os novos sentem isso, mas eu acho que, se você falar com o Nelson ele vai dizer mais ou menos isso, se você falar com a Cecília, ela tem esse tipo de coisa, o Carlinhos, nós tivemos uma coisa que foi crescendo dentro da gente, então do pequenininho, foi, foi, foi, e isso acabou nos satisfazendo, acabou sendo uma coisa muito boa. Agora, quem entrou de uns dez anos para cá, o pessoal pegou uma confusão muito grande de cresce, cresce, cresce, não sei se vou para a direita, não sei se vou para a esquerda, de repente muda, então eu acho que esses funcionários, ele se sentem muito não sei o que, enquanto a gente que é antigo não, você sabe que cresceu, e isso é importante, isso foi muito legal, e mesmo quem a gente vê hoje na reitoria e tal, é gente que está mais ou menos o tempo que estou aqui, 30 anos, é 25 anos, é 40, mais ou menos isso. Então é um pessoal que gosta demais da instituição, e isso cria um vínculo muito grande.
Pergunta:
No seu caso, Claudia, você falou muito de transformação, né? Quais foram as transformações que você consegue destacar em você?
Resposta:
Na verdade, é bem isso. Eu fui uma pessoa muito cética na minha vida, muito. Vamos dizer, chegando a ser ateísta demais, chegando a ser muito revolucionária politicamente, muito de esquerda, fui muito isso. Hoje, eu sou muito centrada, eu sou muito voltada, sou muito mãezona, eu nunca me imaginei sendo mãe. Eu tenho um filho, da minha barriga, mas eu devo ter uma quantidade enorme de filhos do coração, e eles são tão filhos para mim, que realmente eu me preocupo imensamente, e muitos deles foram alunos aqui. [1:25’] Alunos que hoje já são formados, já são casados, tem filhos, e continuam sendo assim, os filhos, e alguns deles até profissionais da minha vida, porque o meu advogado particular foi aluno da primeira turma de Direito daqui, que trabalhou com a gente na biblioteca por cinco anos, e hoje ele é meu advogado e meu filho do coração. Então eu acho assim, que realmente me fez crescer muito também, e esse pessoal, eu digo, mesmo que um dia eu não esteja aqui, eles continuarão presentes em minha vida, e não é nem um nem dois, são muitos.
Pergunta:
Claudia, como que é que é a sua rotina dentro da instituição, se é que você tem uma rotina.
Resposta:
Bom, eu faço assim um processo de distribuição grande de trabalho. Então, normalmente todo o material que chega, ele passa pela minha mão como se fosse uma triagem. Os livros comprados, claro, a gente já separa, porque ele foi tombado, ele foi comprado, então ele não vai ser eliminado de forma nenhuma. Mas, o material que nós recebemos da FEFISA, por exemplo, então todo esse material passou pela minha mão, está passando ainda, porque é muita coisa, e a gente está fazendo aquela seleção, verificando se a gente já tinha o material ou não, se o nosso material é mais antigo ou mais novo do que o deles, o que fica e o que não fica, e separando o que não vai ficar, para distribuir para o aluno, dou um jeito de liberar todas as doações, que não são poucas, são muitas, porque professores vem e trazer de quatro caixas por vez, alunos param ali, muito comum, moradores de São Caetano, ligarem e falarem: ‘olha, eu tenho doações imensas. Então eu faço toda essa triagem e, em questão de revista, de CDs, do que chegar, a triagem é toda minha. Depois, eu faço quase todo o processo de etiquetagem tanto de código de barra quanto de lombada, para fazer uma espécie de crivo de análise, porque eles são colocados no sistema, então na hora que eu vou colocar as etiquetas eu confiro também, porque na hora que você está digitando, muitas vezes você pode errar. Então eu faço essa conferência para ver se está tudo certo, porque uma vez indo para a prateleira, se ele foi errado, o livro está com um número e no sistema está outro, você nunca mais acha. Então você tem que fazer essa triagem também. Então o meu trabalho aqui está sendo muito burocrático ultimamente. Mas, de qualquer forma, também toda a dúvida, aluno que quer pesquisar é comigo mesmo, e material que não acha: ‘o que aconteceu? O funcionário guardou errado? O aluno colocou no lugar errado?’. Então sou eu que vou vasculhar.
Pergunta:
O aluno da USCS mudou?
Resposta:
Ah, o aluno mudou muito. Não acho que é o aluno da USCS, eu acho que é o aluno no geral, mudou muito. Porque assim, a dedicação dos alunos é outra. Ah, o aluno é muito relapso hoje em dia. Aluno frequentador de biblioteca tem alguns, aqueles são caxias, mas se você for na biblioteca a tarde, você vai encontrar várias pessoas na biblioteca, mas com certeza não são alunos. São ex-alunos, são estudantes de concurso, são ex-alunos que dão aula, que vão preparar aula. Existe ex-aluno cotador, que vem em ordem de certas coisas, pesquisar. No campus Centro, muito aluno de Direito que vai utilizar material de Direito, então muito ex-aluno usa muito a biblioteca. E, o aluno mesmo, ele só usa em período de prova, quando o trabalho está explodindo, que tem mesmo que ir lá de algum jeito, então realmente o aluno mudou bastante.
Pergunta:
Antigamente não era assim.
Resposta:
Ah, eles eram muito dedicados. Realmente era uma época que era…eu não sei se eles eram mais cobrados, mas eu acho até que não era tanto pela cobrança não, eles tinham vontade mesmo, porque alguns desses alunos de praticamente 30 anos atrás, eu tenho amizade também, são pessoas que volta e meia estudam muito. Para contar um episódio diferente, há dois anos atrás eu estive em Foz do Iguaçu, e eu estou na porta do hotel esperando o meu receptivo, e tinha um casal que não parava de me olhar até que, de repente, o rapaz chegou para mim e falou: ‘eu te conheço de algum lugar, não é possível!’ e tal tal. Aí começamos a conversar, e eu não lembrava muito, provavelmente ele tinha mudado muito fisicamente, qualquer coisa assim, até que chegamos a conclusão, porque eu estou em Foz do Iguaçu: ‘da onde você é?’ ‘eu sou de São Bernardo’. [1:30’] Aí eu acabei sintonizando, ele foi aluno de graduação, aluno de pós-graduação e aluno de mestrado! Quer dizer, ele fez uma carreira toda aqui dentro. Evidentemente que ele me conhecia, porque eu devo tê-lo atendido algumas vezes. Depois eu soube que ele engordou muito, então ele também ficou diferente [risos] e teve um tempo que ele também deu aula aqui. Hoje, ele dá aula na UNICSUL, alguma coisa assim. Então você vê, era uma pessoa empenhada, e é uma pessoa empenhada até hoje, como professor está lá continuando a pesquisar e fazer aquela coisa toda. Então esse tipo tinha bastante aqui.
Pergunta:
Mais a questão da geração.
Resposta:
Foi, foi realmente uma geração que foi muito para isso, vários que são grandes advogados, vários que são bons professores mesmo em quase todas as áreas, então essa turma que eu vi na época, muito que são professores aqui dentro, que também foram alunos aqui, então são pessoas pesquisadoras empenhadas. Os nossos alunos mais novos já não é mais tanto a mesma coisa, isso é verdade. Agora, eu sei também que no campus Centro a biblioteca é muito mais usada. Direito e Saúde já é uma coisa que também não pode ficar muito na internet, eles precisam realmente de livros. Então, eles usam mais.
Pergunta:
Claudia, eu perguntei para você no começo quais eram aqueles livros de referência daquele seu período lá dos 7 aos 14 anos, vamos abrir um pouquinho mais essa régua. Fale um pouco das obras que te marcaram que são influências na sua vida.
*Fim da parte 4*
Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS)
Núcleo de Pesquisas Memórias do ABC e Laboratório Hipermídias
Depoimento de Claudia Conceição Bueno dos Santos, 59 anos.
São Caetano do Sul, 16 de novembro de 2016.
Pesquisador: Luciano Cruz
Equipe técnica: Ileane da Silva Ribeiro
Transcritora: Bruna Moura
*Continuação do depoimento de Claudia Conceição Bueno dos Santos - parte 5*
Pergunta:
Claudia, eu perguntei para você no começo quais eram aqueles livros de referência daquele seu período lá dos 7 aos 14 anos, vamos abrir um pouquinho mais essa régua. Fale um pouco das obras que te marcaram que são influências na sua vida.
Resposta:
Que são influências na minha vida…bom, eu li tanta coisa…
Pergunta:
É uma pergunta fácil, né?
Resposta:
Para te dizer, na época lá de 7 anos, a primeira coisa que eu li, foi uma coisa que caiu na minha mão, foi a Bíblia, e aí me deixou extremamente revoltada com um monte de coisa [risos], isso foi assim, complicado. Mas assim… nos últimos tempos, eu gostei muito…de coisas mais místicas, sabe? Eu passei a ler coisas muito mais místicas, a nível de Brumas de Avalon. Era uma coisa assim bastante mística, bastante diferente, e eu acabei gostando de uma literatura um pouco mais ficcionista nessa área, né? E eu gosto muito de um brasileiro, chama Eduardo Spohr, ele é um historiador e um mitologista. Então os livros dele são só falando sobre os mitos, ou melhor, tem uma ligação daqueles mitos que interagem entre si. Então eu estive, inclusive, em noite de autógrafo dele, fui pessoalmente com ele, ele é uma pessoa espetacular, e em palestras dele, ele é muito bacana, então hoje eu sou muito aficcionada nesse tipo de literatura, que vai muito pelo lado de Guerra do Tronos, mas ele é um brasileiro.
Pergunta:
Fica a dica então, se você gosta de Eduardo Spohr, não se se você ouviu, tem um podcast, que é o nerdcast.
Resposta:
Nerdcast, isso mesmo!
Pergunta:
Participa bastante?
Resposta:
Ixi! Exatamente! Meu filho é fanático, ele liga lá direto, e foi aí que eu conheci o Eduardo. Depois, por ali, eu comecei a ler um livro dele, Batalha do Apocalipse. Me apaixonei e li todo o resto [risos].
Pergunta:
Ele é novo?
Resposta:
Ele é novo, ele tem uns 35 anos, ele é novo…
Pergunta:
Você ouve ele falando tem a impressão de ser mais velho.
Resposta:
Exatamente! E ele faz dublagem bastante de muitos seriados, então às vezes eu estou assim ouvindo algum filminho, aí meu filho fala assim: ‘esse aí é o Eduardo, oh! É o Eduardo!' [risos]
Pergunta:
Claudia, você falou que quando você foi para o IMES cobrir aquelas férias, você não tinha muito ideia do que era a instituição ainda, né? Uma universidade… Queria que você falasse hoje, com toda a sua experiência dentro da USCS, define para a gente o que que é a USCS.
Resposta:
Pois é. A USCS é uma coisa assim, praticamente mágica, né? Porque, se a gente pensar bem, a maioria das universidades, das faculdades e tal, começaram a se agregar, e os donos são grandes, monopólios de educação, né? A gente vê pela Anhanguera, que agora é Kroton, todo mundo foi criando esses grandes núcleos e com uma coisa assim, muito impessoal. [1:35’] A USCS ainda é uma coisa muito pessoal, ela tem a identidade dela, ela foi crescendo nessa identidade. Então era justamente uma coisa que eu jamais gostaria que deixasse de ser, que ela realmente até crescesse mais mesmo, que ela consiga entrar nesses outros campos que estão tentando entrar, entrar para a Engenharia em algumas áreas, e quem sabe Odontologia também, essa coisa toda, porque você pode criar uma identidade ainda maior e não ser mais um conglomerado. É realmente uma coisa assim que… essa identidade ela não pode perder.
Pergunta:
Já partindo para finalizar o nosso papo, e já agradecendo também imensamente o seu bate-papo, parabenizando pela sua trajetória, queria que você falasse se tem algo mais que você gostaria de destacar que você acha que é legal deixar para a memória, para esse nosso projeto que homenageia os 50 anos da universidade.
Resposta:
Olha, uma coisa interessante, era buscar também algumas pessoas que já foram aqui da instituição muito tempo, e que estão fora agora, mas que participaram do crescimento dela, vamos dizer assim, a Odete mesmo, que foi uma das bibliotecárias de maior tempo aqui dentro, ela não foi a primeira, mas as outras que estiveram antes fizeram um trabalho pequeno e tal, mas ela seria uma pessoa interessante de estar sendo destacada, porque realmente ela esteve aqui muito tempo. Vocês já tiveram a oportunidade de falar com a Leila e tal, mas essas pessoas assim que, até alguns professores mais antigos, serem trazidos e falarem, porque a grande maioria deles realmente gosta muito, que era do caso do Denis, que realmente sempre gostou demais da instituição, ele sempre foi muito acadêmico, muito ligado, mas eu acho que ainda tem muitos professores também que isso seria importante.
Pergunta:
É isso?
Resposta:
É isso!
Pergunta:
Muito obrigado!
Resposta:
Imagina! [risos]
Lista de siglas presentes no depoimento:
GC: Gerador de Caracteres
GM: General Motors
USCS: Universidade Municipal de São Caetano do Sul
IMES: Instituto Municipal de Ensino Superior
CEAPOG: Centro de Estudos e Aperfeiçoamento e Pós-Graduação
DCE: Diretório Central dos Estudantes
EDS: Electronic Data Systems
PUC: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
HQs: Histórias em Quadrinhos
AACC: Atividades Acadêmicas Curriculares Complementares
FEFISA: Faculdades Integradas de Santo André
UNICSUL: Universidade Cruzeiro do Sul